30 de setembro de 2007

PSD na oposição

Depois da estupefacção dos primeiros momentos, vamos tentar fazer uma análise um pouco mais séria do resultado das eleições do PSD.
Marques Mendes não foi um bom líder. Nenhum líder do PSD é bom, quando o partido está na oposição, simplesmente porque o PSD não sabe viver na oposição.
Oposição, hoje em dia, significa fundamentalmente fiscalização. Apesar de todos os discursos em contrário, é, efectivamente, uma tarefa muito mais negativa do que positiva, no sentido em que não consiste tanto na apresentação de propostas alternativas – a chamada “oposição construtiva” –, mas mais no controlo de quem detém o poder.
Numa era em que a Assembleia da República foi esvaziada da sua função legislativa, que pertence na sua grande maioria ao governo, é esta função fiscalizadora que deveria animar os nossos deputados. A democracia já não é garantida tanto pela separação de poderes pelos vários órgãos de Montesquieu, mas pela separação governo/oposição.
Ora, o PSD é um partido de poder. E é-o muito mais do que o PS. O PSD existe para ocupar a máquina do Estado, não para fiscalizar a actuação de quem a ocupa. Os socialistas – embora também façam as suas “travessias do deserto”, quando saem do executivo – ainda conseguem, graças à (pouca?) alma de contra-poder que mantêm, ir limitando a acção dos executivos laranjas. O PSD – está provado – não consegue levar a cabo esta hercúlea tarefa.
Assim, durante os anos de governação socialista, qualquer líder do PSD será sempre um mau líder, será sempre acusado de não fazer oposição e não a fará, de facto, porque não é para isso que o partido está talhado. Obviamente, os militantes de base exasperam-se com esta situação, pensando sempre que, com outro (qualquer outro), tudo seria diferente (a maioria deles, pelos visto, pensa que, com Menezes, a oposição será completamente diferente do que era com Mendes. Engano!) ...
Deste modo, qualquer líder do PSD será sempre um líder a prazo (excepção feita a Durão Barroso, que teve a sorte de ser chamado repentinamente a eleições, após a demissão de Guterres e antes que houvesse tempo para “correrem” com ele internamente).
A conclusão péssima de tudo isto é óbvia: o PS governa, geralmente, sem oposição ao seu nível. Vale-nos a ética republicana dos socialistas, que ainda vai resistindo, para que a coisa não descambe…
A conclusão óptima de tudo isto é a de que Luís Filipe Menezes vai durar pouco, muito pouco, porque, tal como Marques Mendes, não vai conseguir mobilizar um partido que só se anima nas vésperas do poder. Daqui a um ano, senão antes, os barões (e os príncipes) organizar-se-ão para provocar a queda do líder recém-eleito e colocar, no seu lugar, alguém capaz de desafiar Sócrates, em 2009. (Porque a eleição de sexta-feira não foi uma derrota dos barões do PSD, dado que estes nem sequer se mostraram. Nesta escala, dizer apenas em quem se vota, sem mais, é sinónimo de ausência. E muitos nem o disseram sequer. A eleição de sexta-feira foi a prova do quanto estes barões continuam a manter o grau de influência no seio do partido: quando não aparecem, a coisa dá para o torto… E não aparecem, porque sabem que não vale a pena apoiar ninguém! Nestes momentos, é mais ou menos indiferente quem ocupa a cadeira da chefia, dado que isso corresponderá a muito pouco em termos práticos.)
Mais: o candidato de 2009, após a previsível derrota, durará, também ele, muito pouco, assistindo-se a mais uma fase vazia e estéril no PSD, com danças de cadeiras que pouco significado terão, porque o poder estará, mais uma vez, adiado. Até 2013.

29 de setembro de 2007

O PSD enlouqueceu?

Sou uma acérrima defensora das eleições directas nos partidos e não será o resultado de ontem, no PSD, que me vai fazer mudar de ideias. Acho mesmo que deve ser dado, às bases partidárias, o poder de escolherem o seu líder (não, não sou filiada em nenhum partido), à semelhança do poder que se confere a todos os cidadãos, para que designem os detentores dos cargos públicos. Mas o Menezes?! Está tudo doido! Já dizia o outro e ainda há poucos dias…

28 de setembro de 2007

Sócrates devia pôr o PS a pensar

Quando Blair “conquistou” o Labour, percebeu que não poderia levar a cabo as políticas que entendia necessárias sem antes fazer uma reformulação ideológica interna. O Labour tinha que mudar por dentro antes de se apresentar com outra face ao país. Dito assim, parece simples, mas não é. E não o foi, na época.
Podemos concordar ou discordar de Blair, mas não podemos negar que ele teve a coragem de cortar com a doutrina e com a prática tradicionais do seu partido. Os sindicatos que o digam… O Labour deu, então, lugar ao New Labour.
Mas não vamos (ainda) discutir as mudanças ideológicas que corresponderam a esta mudança de nome (e, já agora, de aspecto, no sentido literal da palavra).
Vamos, isso sim, chamar a atenção para o facto de, em Portugal, NUNCA ter acontecido um processo semelhante. Estados Gerais e Novas Oportunidades que me perdoem, mas… todos sabemos que não corresponderam a um movimento ideológico digno desse nome. Desde logo, foram fenómenos curtos (no tempo), concentrados (no espaço), fechados (a quase todos).
Ferro Rodrigues tentou fazer um pouco diferente, reformulando a Declaração de Princípios e criando os Grupos de Estudos – mas veio o “caso Casa Pia” e, com a prisão do seu principal organizador, o PS meteu uma “licença sem vencimento”…
Quanto às famosas eleições internas, que opuseram Alegre, Soares-filho e Sócrates, a verdade é que, da parte do vencedor, pouco comprometimento ideológico houve. Sócrates afirmava-se socialista, mas… o que é que entendia por ser socialista, além de ser favorável à despenalização do aborto? Dizia ser apologista de uma “esquerda moderna”, mas… o que era isso exactamente, além de apostar na formação e nas tecnologias?
Assim, actualmente, o PS (tenha consciência disso ou não) ainda conquista votos graças à História, ao papel por si desempenhado na História do país. Os eleitores confiam hoje, porque puderam confiar no passado.
Por outro lado, o PS ganha eleições graças à “saturação” que os eleitores atingem relativamente aos governos de direita. Foi assim com Guterres, no pós-cavaquismo; foi assim com Sócrates, no pós-barrosimo/santanismo (neste caso, gozando o PS de uma ajuda extra: o santanismo, precisamente…).
Nenhum destes dois factos é, por si só, negativo. Pelo contrário, são até processos muito naturais. Mas temos que atentar no facto de o discurso eleitoral do PS se basear fundamentalmente em meia dúzia de promessas, a maioria das quais – cumpram-se ou não – nada têm de profundo, de ideologicamente profundo, por muito válidas que sejam. Dê-se o exemplo das aulas de inglês na escola primária – ou lá como se chama agora – para ilustrar. E temos que atentar neste discurso eleitoral, precisamente porque ele é sintoma do vazio que reina no PS. Não vazio de nomes, nem sequer de ideias avulsas, mas vazio de um conjunto sistematizado de ideias, fruto de um corpo axiológico coerente. Assim, as medidas governativas parecem surgir “desgarradas”, soltas, sem união. Qualquer novidade nos surpreende e não nos surpreende, ao mesmo tempo.
Sócrates devia ter-se antecipado à ida para o governo. Talvez não tenha tido tempo – Santana Lopes precipitou os acontecimentos. Mas ainda vai a tempo de pôr o PS a reflectir sobre que valores a social-democracia portuguesa (que está no PS e não no PSD) entende serem válidos, pelo menos, para a segunda década do séc. XXI.