21 de novembro de 2007

O Liberalismo e a Esquerda

No Esquerda Republicana, o Filipe de Castro distingue entre o liberalismo americano e o liberalismo europeu.
Diz-nos que os liberais do lado de cá do Atlântico se limitam a defender o liberalismo económico, não se preocupando com o verdadeiro liberalismo político. Daí que se aproximem muito mais dos neocons do que dos liberais do lado de lá do Oceano.
Eu concordo. Há muito tempo que o auto-designado liberalismo europeu deixou de o ser verdadeiramente! Primeiro, porque se ateve na defesa do liberalismo económico, depois, porque se aproximou a passos largos dos valores conservadores.
Hoje, no lugar da tradição liberal histórica, encontramos, isso sim, o neo-liberalismo, que mais não é do que a junção de uma defesa do mercado livre levada às últimas consequências com uma defesa dos princípios morais mais tradicionais. Thatcher e Reagan foram os expoentes máximos desta corrente neo-liberal, claro.
No fundo, isto significa que, na Europa, aquilo a que comummente chamamos liberalismo perdeu o seu núcleo fundamental, que era, logicamente, o das liberdades civis e políticas.
É por esta razão que os europeus associam o liberalismo à direita, enquanto que os americanos lhe atribuem a conotação à esquerda: porque, efectivamente, o liberalismo europeu se desvirtuou e, assim, recuou para a direita do espectro político.
Ser-se liberal, na Europa dos nossos dias, tem muito mais de burkeano do que de lockeano: é-se liberal na economia, mas conservador nos costumes.
É, talvez, por esta razão que, sempre que alguém de esquerda se diz liberal, há alguém que torce o nariz ou olha com ar surpreendido. Porque se pensa sempre no lado económico do liberalismo e não no seu lado mais importante, que está para lá do laissez faire, laissez passer e que é o do liberalismo aplicado à vida política e à vida civil dos cidadãos.
Mas a esquerda é, desde há muito, herdeira do liberalismo. Bernstein, “pai” da social-democracia, dizia, no início do séc. XX, que “não existe hoje um pensamento realmente liberal que não pertença também aos elementos do ideário socialista” (pág. 117, Socialismo Evolucionário).
E recomendava “alguma moderação ao declarar guerra contra o liberalismo”, porque, se era certo que “os partidos que tomaram o nome de liberais eram ou acabaram por converter-se em simples guardiães do capitalismo”, também era certo que “as qualidades espirituais” do liberalismo passaram para o socialismo democrático.
Para Bernstein, a social-democracia não queria fundar uma sociedade proletária, mas sim uma sociedade onde o proletário usufruísse dos direitos de cidadania, tal como definidos pelo movimento liberal. Hoje, as faixas da população a necessitarem de um alargamento de direitos serão outras, que não o proletariado; serão mesmo outros os direitos a necessitarem de defesa, porquanto os da época já se tornaram (mais consensuais). Mas o princípio mantém-se. E continua a pertencer à esquerda.

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