9 de outubro de 2007

Recorrer a Marx para ler os números do Portugal de hoje

Em Setembro, o índice de expectativa dos portugueses voltou a baixar: estamos mais pessimistas relativamente à evolução da economia do país e da nossa situação económica individual. Segundo o Barómetro Marktest, o valor do índice foi de 35.1% (menos 7.7% relativamente a Julho e menos 19.3% relativamente a Setembro do ano passado).
Por outro lado, a taxa de desemprego atingiu os 8,3%, a mais alta, pelo menos, desde há duas décadas, ultrpassando a taxa de desemprego de Espanha pela primeira vez também em mais de 20 anos.
Estes números são demonstrativos da situação em que se encontra a maioria do nosso corpo social: a classe média empobreceu extraordinariamente, o desemprego atinge faixas cada vez mais díspares da população activa, (quase) todos apresentam pouca confiança no futuro... Resumindo, as políticas de crescimento económico e de criação de emprego não estão a resultar como se previa. "Novas oportunidades" e "plano tecnológico" ainda não deram frutos e está na altura de nos perguntarmos se o caminho que está a ser seguido é o mais correcto.
Mas está também na altura de pensarmos sobre quais as consequências que podem advir da manutenção (ou agravamento) da situação económico-social que vamos vivendo há, pelo menos, seis anos.
Em 1848, no célebre Manifesto do Partido Comunista, Marx e Engels escreviam que "os pequenos estados médios até aqui (...) caem no proletariado" (pág. 44). Estava-se, então, em plena Revolução Industrial. Se, numa terminologia mais próxima dos nossos dias, substituirmos "estados médios" por "classe média" e "proletariado" por "pauperização", percebemos que podemos recorrer de algum modo a Marx para olhar para a realidade portuguesa deste início de século. Porque a classe média caiu, de facto, numa pauperização de que não vê forma de sair.
Claro que Marx e Engels consideravam que uma classe média nunca seria revolucionária; pelo contrário, será mesmo conservadora, pois apenas quereria manter a sua posição anterior, nunca instaurar um novo contexto político-social. No entanto, apesar disso, estes estados médios não deixariam de combater os responsáveis pelo seu declínio, mesmo que "apenas" (para Marx e Engels era apenas...) pela manutenção do status quo.
Neste momento, a maioria da população portuguesa já não vive num estado de apatia tão generalizada quanto há uns meses ou anos atrás. A classe média, farta de apertar o cinto e com baixas expectativas de futuro, já não se encontra tão acomodada, tão receptiva a aceitar todas as políticas governamentais como positivas e sem questionamento. Será que, a médio prazo, se a sua queda (económica e social) não se detiver, é de esperar um desejo de mudança profundo?
Marx e Engels também afirmavam que "todas as classes anteriores que conquistaram a dominação procuraram assegurar a posição na vida já alcançada, submetendo toda a sociedade às condições do seu proveito" (pág. 47), o que havia deixado de acontecer com a burguesia. Assim, quando a maioria da sociedade deixa de ver asseguradas as suas condições de vida próprias, pode (para Marx, deve) revoltar-se.
Numa sociedade democrática e liberal como a nossa, como se pode expressar esta revolta? A História ensina-nos que, nestas fases de crise, as sociedades descontentes - mesmo as democracias representativas - inclinam-se para os extremos políticos. Com tudo o que daí advém. Está, pois, na altura de quem nos governa começar a pensar seriamente nas consequências de políticas que claramente não estão a cumprir os seus objectivos.

8 comentários:

Anónimo disse...

Lamentavelmente , esses energumenos que nos desgovernam quando alvo de criticas soletram a palavra DEMOCRACIA , com a finalidade de serem desculpados da situação economica e social que portugal atravessa.
Não adianta tapar o Sol com uma peneira,costumo dizer que portugal tem 3 classes ,os que nada tem, os que suam para ter alguma coisa e os outros, aqueles que a custa dos pobres e da ineficacia da maquina fiscal vão enriquecendo e que não tendo vergonha na cara se fazem mostrar nas nossas Avenidas.
Na verdade , considero que Portugal não tem remedio possivel, alguma coisa mudará só por influencia de outro Pais da Europa Central ,como alias nos diz a Historia do ultimos 300 anos, mas para lá chegar ainda vamos ter que esperar muito tempo, em toda a Europa a democracia social está ja fase da solidificação , enquanto nós , nós Povo ignorante estamos na fase do molde, onde o ferreiro ainda bate as arestas.

psergio57 disse...

Estou de acordo. O declínio da classe média e o caruncho que corrói os fundamentos da democracia no nosso País (corrupção, nepotismo e aumento das desigualdades)não auguram nada de bom. Resta saber até que ponto o 'escudo' proporcionado pela UE e a falta de credibilidade de velhas receitas poderão ajudar a perpetuar a sombra que parece pairar sobre a maioria dos portugueses.

Anónimo disse...

Bem daqui a pouco aparece por aqui o
inefável Medina Carreira, mestre na rentabilização para proveito próprio do miserabilismo social, ie, quanto piores estão as coisas , melhor está ele.
Acontece que a situação não está boa,economicamente, mas está lentamente a melhorar, e não me parece que haja outra forma de dar a volta a isto.
O que acontece é que os nossos males são antiquissimos e passa por uma sociedade acritica e na falta de um processo mental capaz.
Pensar não custa, mas pensar correctamente exige esforço e nalguns casos alguma coragem.
Portugal nunca passou verdadeiramente pela R. Industrial e falhou quase todos os processos de modernização Europeus do sec. XX, só no ultimo quartel conseguiu uma "democracia", desenvolver a Educação e a Saude, etc...
As elevadas taxas de desemprego reflectem a mudança de paradigma do nosso tecido produtivo, e dão-se em quase todos os países que passam/passaram por esta dificil etapa.
Talvez um certo discurso que prometeu o sol na terra e baseado em demagogia ultrapassada ainda faça sentido se olharmos só aos efeitos e não ás causas.

Anónimo disse...

É uma mania, esta de atribuir tudo aquilo que acontece ao país ao bom ou mau governo!

Portugal empobrece por uma razão básica muito simples: porque o nível educacional dos portugueses - tanto operários como gestores como patrões - é muito baixo. Numa sociedade cada vez mais tecnológica e cada vez mais requintada, ter um baixo nível educacional é, a longo prazo, fatal.

E isto nada tem a ver com o bom ou mau governo deste país. Tem a ver com a atitude básica da generalidade da população portuguesa face à educação.

Luís Lavoura

Anónimo disse...

Não Luiz, tens toda a razão aquilo que o Governo tem culpa é do aumento insuportável de impostos; é de ter um discurso demagógico para ganhar eleições e querer de seguida dar lições de moral; é causar espectativas a uma população que está em dificuldades e em precessos de mudança desde de 74.
A responsabilidade deste Governo está nas promessas impossiveis de concretizar, são estas atitudes de desprezismo pelo cidadão comum que podem e repito PODEM levar uma população com poucos estudos a revoltar-se ou apoiar um outro demagogo qualquer que venha prometer uma vida melhor...

Anónimo disse...

O que este governo está a fazer é, na minha opinião, o contrario, Por exemplo, se queremos salvar a Segurança Social e que ela incida sobre a maior base possivel de Portugueses, não podemos prometer-lhes a grande parte deles (Função Publica) a reforma a 100%, nem aos militares mordomias que abrangem a familia inteira mais os sobrinhos, etc.. O mal foi que não houve uma adequação realista e corajosa das potencialidades do País aos beneficios e autenticos saques que foram feitos pelas corporações junto de politicos mediocres em anos de eleições, e não só.O mesmo foi feito com os Fundos Europeus.

Que alternativa havia ao aumento drastico de impostos de modo a cumprirmos o prazo dado pela UE?

psergio57 disse...

O discurso de um País empobrecido com os 'privilégios' dos funcionários públicos provém quase sempre do sector das profissões ditas liberais ou de empresários, classes conhecidas pelos seu elevados índices de solidariedade social e cumprimento fiscal... Não lhes convêm, ao momento, falar de toda uma série de opções erradas e fundos malbaratados que os enriqueceram (os sinais exteriores multiplicaram-se muito para além do razoável); mas esse patobravismo pouco contribuiu para a qualificação das pessoas ou para a modernização e adaptação do aparelho produtivo e da máquina do Estado e o resultado está à vista...

Anónimo disse...

O contrário?????
Não anda a fazer publicidade enganosa constantemente?
Não cria expectativas na população sabendo que não vai conseguir, mais tarde, corresponder a elas?
A classe média (classe média não é um termo que me agrade, mas facilita a linguagem) está cada vez mais asfixiada, será que se esqueceram que é esta franja da população que mais estabilidade traz a uma democracia?
Precisamos da reforma da função pública..parece que só na próxima legislatura é que se vai ter avanços concretos nessa área...
E conter a despesa...não percebo, depois de uma quase estagnação do investimento público a despesa continua a aumentar, aliás, se os portugueses estão individados não podemos nunca esquecer que o exemplo deve vir de cima.
Prefiro uma critica honesta e frontal dizendo apenas que a demagogia faz parte da politica..se querem mudar o país comecem por aí.