De tempos a tempos, a questão do sistema eleitoral é trazida à discussão, para logo morrer. Agora, parece que não está na moda… Mas eu acho-a importante.
O sistema que mais agrada (porque há que ser construtivo) é um sistema eleitoral misto, um sistema que contém em si o sistema proporcional e o sistema maioritário, o que lhe permite conciliar as vantagens e minorar os defeitos de ambos.
Como fazer? Como na Alemanha! Quando um cidadão alemão vai votar, em eleições legislativas, são-lhe entregues dois boletins de voto: um é usado para votar num círculo nacional, segundo um sistema proporcional, o outro é usado para votar num círculo local, segundo um sistema maioritário e uninominal.
No fundo, atribui-se duplo voto a cada eleitor, sendo cada um dos votos utilizado para eleger metade do Parlamento. No círculo nacional, os partidos apresentam listas, cujos nomes são os das grandes figuras partidárias; nos círculos uninominais, cada partido apresenta um candidato, com reais ligações à região e com a função de representar a sua população.
Deste modo, associávamos, em Portugal, a proporcionalidade, permitida pela existência de um círculo nacional – e a consequente representação parlamentar de uma vasta fatia do espectro político e não apenas dos dois principais partidos – às características positivas do sistema maioritário uninominal.
(Ao argumento de que, mesmo assim, os pequenos partidos desapareceriam – pois, com a redução do sistema proporcional a metade do Parlamento (115 deputados), não conseguiriam eleger deputados –, respondemos com a matemática. Se imaginarmos que os resultados das últimas eleições legislativas são obtidos pelo círculo nacional, concluímos que, aplicando o método de Hondt:
- o PS elegeria 55 deputados,
- o PSD obteria 35 lugares,
- PCP e CDS-PP conquistariam 9 assentos cada um
- e o BE elegeria 7 deputados.
Assim se percebe que os três mais pequenos, apesar de verem reduzida a sua representação – actualmente, o PCP detém 14 lugares no Parlamento, o PP, 12 e o BE, 8 –, não sairiam tão prejudicados desta alteração como inicialmente somos levados a pensar. Tanto mais que, como dissemos no “2º episódio”, talvez o PCP – partido que, ainda assim, veria o seu número de deputados mais reduzido – conseguisse eleger alguns representantes pelos círculos uninominais.)
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12 comentários:
Concordo genericamente com a proposta da Ana Rita.
Que eu saiba, é precisamente um sistema deste tipo que o PS pretende defender.
Eu faria uns pequenos ajustes. (1) A eleição no círculo nacional deveria ser pelo método do menor resto, e não pelo método de Hondt, por forma a permitir uma proporcionalidade mais perfeita. (2) Alguns dos círculos locais poderiam ser bi-nominais ou até tri-nominais, dado que há círculos - por exemplo, a cidade de Lisboa - que têm muita população, mas que não faz sentido dividir em círculos mais pequenos. (3) O círculo nacional deveria eleger um pouco mais de metade dos deputados (digamos, 60%) por forma a reforçar a proporcionalidade.
Luís Lavoura
Faço notar que um sistema misto deste tipo encarece o sistema político. De facto, os partidos passam a ter que fazer campanhas eleitorais locais, uma para cada círculo uninominal. Isso faz com que as campanhas eleitorais sejam bastante mais caras, logo, exige que o sistema político na sua generalidade extraia mais dinheiro à sociedade. Além disso, os deputados locais teriam que, regularmente, contactar com os seus cidadãos eleitores para auscultar o seu sentimento, o que aumentaria, ainda mais, os custos do sistema político.
Luís Lavoura
Não podemos partir do principio, falso e contrariado pela experiência, que o sistema eleitoral não muda o sentido de voto. A bipolarização no voto dos deputados dos circulos muninominais, arrastaria a uma bipolarização de todo o voto. São uma minoria as pessoas que votam diferente numa mesma eleição.
Os sistemas eleitorais podem servir para mudar a representação, mas serve igualmente para mudar o sistema partidário.
O sistema alemão não funciona assim. Não é metade dos deputados eleita por sistema maioritário e a outra metade eleita por sistema proporcional
No sistema alemão, metade dos deputados são eleitos por sistema maioritário e a outra metade é distribuida de forma ao total dos deputados ser proporcional.
P.ex, o BE não elegeria 7 deputados - pelas minhas contas, elegeria cerca de 14 (14 no círculo nacional e 0 nos locais).
Se o PS, com a votação das últimas eleições, elegesse cerca de 70 deputados nos circulos locais, elegeria 40 deputados no circulo nacional, para o total serem 110 deputados (a votação do PS aplicada a 230 lugares).
"São uma minoria as pessoas que votam diferente numa mesma eleição."
Este comentário do Daniel Oliveira faz lembrar aqueles que pensam que o povo é demasiadamente estúpido para se lhe poder dar o direito ao voto. Que o povo não percebe, não sabe para que é que está a votar, e então, vota às cegas.
Ora, muita experiência sugere o contrário: as pessoas geralmente percebem, mais ou menos, para quem é que estão a votar. Repare o Daniel por exemplo que as pessoas votam diferentemente nas eleições legislativas e municipais - por exemplo, em Salvaterra de Magos as pessoas votam BE para o município, porque querem a Anita, mas não votam BE para as legislativas.
Luís Lavoura
Para testar a hipotese do DO, deveriamos ir ver países que tenham um sistema de tipo alemão e medir a concentração partidária dos votos nesses paises (p.ex., calculando um indice de Gini) e depis comparar com Portugal, para ver se isso causaria ou não bipolarização (no caso da Alemanha, deveriamos contar a CDU e CSU como um só partido).
Luís Lavoura, não se trata de inteligência ou falta dela. Os sistemas eleitorais têm em conta os comportamentos eleitorais. Se grande parte dos confrontos eleitorais são entre duas forças, a comunicação social, a campanha e tudo o resto tende a afunilar-se nessas duas forças.
As pessoas votam de forma diferente em eleições diferentes, mas não quando elas acontecem em simultâneo. Por exemplo, nas únicas europeias que aconteceram em simultâneo com legislativas, com excepção do CDS (fenómeno Lucas Pires), os resultados foram muito identicos. Compara as votações para as juntas de freguesia e câmaras, com candidatos diferentes, e verás que não diferem em quase nada. Nada disto tem a ver com estupidez, como é evidente. Condiero-me uma pessoa minimamente inteligente e não me lembro de ter votado diferente para a junta e para a câmara.
Olá Rita (já agora, eu já tinha lido sobre este blog mas não sabia que era teu :-P)
Dentro dos sistemas eleitorais que se baseiam na ideia da personalização da representação (ou seja, o meu representante não é uma lista com um programa mas uma pessoa que deverá negociar votos) o sistema alemão parece-me o menos mau. A cláusula-barreira alemã é muito elevada, mas é o menos mau.
O que eu contesto (oh, eu sei, estou contra a corrente) é a própria bondade da personalização da política. A ideia de se multiplicarem queijos limianos assusta-me.
E que tal um sistema (bastante revolucionário, concedo...) em que os eleitores votassem para um UNIVERSO ELEITORAL ÚNICO, no qual o limite para a proporcionalidade absoluta entre votos e mandatos fosse a óbvia impossibilidade de retalhar Deputados, e no qual, muito para além disso, os eleitores possuíssem um número fixo de votos para DISTRIBUIR pelos Partidos concorrentes?
Penso que, revolucionariamente, voltaríamos a ter verdade eleitoral, abstenção drasticamente reduzida e muitíssimo menos "voto útil"...
Só vantagens, não é? Depende dos objectivos, claro...
Quem me iluminou com esta ideia foi um célebre... matemático francês, Jean Charles Borda (Séc- XVIII, pois é, as Luzes...).
Infelizmente, os políticos não o conhecem (nem percebem nada de Matemática) e o seu método, cientificemente demonstrado ser o mais democrático possível (tanto que até foi proibido por Napoleão Bonaparte...), só é "desperdiçado" em eleições menores como os festivais da canção, ou as misses. É pena...
Para haver círculos uninominais e um círculo nacional não era preciso haver dois votos. Bastava que os deputados pelo círculo nacional fossem eleitos pelos votos sobejantes.
Os votos nos candidatos derrotados reverteriam, no círculo nacional, a favor dos respectivos partidos - ou, no caso dos candidatos independentes, dos partidos que eles tivessem previamente indicado.
Dos votos no candidato vencedor, reverteriam para o partido os que tivessem sobrado.
Caro a. castanho:
O seu sistema fez-me lembrar um que vi descrito há vários anos na revista The Sciences e que era aplicado no departamento de matemática duma universidade americana de cujo nome não me recordo.
Era assim:
Cada eleitor tinha um boletim de voto exactamente igual àqueles a que estamos habituados, mas podia assinalar tantos quadradinhos quantos quisesse. Se o boletim tivesse quatro quadradinhos, por exemplo, e o eleitor só assinalasse um, os que não tivesse assinalado seriam entendidos como votos negados pelo eleitor aos candidatos correspondentes.
Por este sistema, assinalar todos os espaços seria quase equivalente a não assinalar nenhum. Interessante é a possibilidade que este sistema dá ao eleitor de conjugar o voto "realista" com o voto útil, bem como a possibilidade de votar "contra" assinalando todos os quadradinhos excepto um.
Parabéns pelo V/ Blog/Tema.
A eleição para a presidência do partido, nos dois partidos (PS e PSD) que geram primeiros ministros, é a única actividade política em Portugal com significado. O resto é folclore democrático. No presente sistema político todas as eleições (parlamento, autarquias, europeias e presidenciais) elegem "representantes" com MENOS poder político que o primeiro ministro (money talks). E este, presidente de um partido, é eleito apenas PELOS SEUS MILITANTES!!!. Os senhores deputados têm tanto a certeza que nunca serão eleitos num sistema eleitoral PARA-NOMINAL que nunca mudarão a lei eleitoral... Que sistema político é este? Ditadura de uns militantes de dois partidos ? Como se deverá chamar ? Parlamentarismo? Presidencialismo? Partidocracia?. Adivinha: Quem foi o pai desta Lei Eleitoral?. O grande democrata que salvou Portugal de todas as tiranias ? :-)
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